terça-feira, 12 de outubro de 2010

O Ônibus



Estava eu, sentado tranquilamente dentro de um coletivo, indo do meu bairro para o centro da cidade. No meio do caminho entra uma senhora com dois filhos, uma menina que deveria está com a idade de quatro anos e um garoto que não deveria ter mais de dez anos. Sentaram-se, a menininha do lado da janela e garoto no banco do corredor. A mãe em pé com o celular no ouvido falando não se sabe com quem. O garoto começou a beliscar a irmã, queria ir para a janela. A menina chorava e gritava pela mãe que no telefone não dava a mínima para as crianças. O garoto começou a puxar o cabelo da garota bater-lhe no rosto. A garota chorava e gritava. A mãe ainda com o celular no ouvido dizia:

“Fica quietas crianças”

Um rapaz ao meu lado, apesar da vibração excessiva do coletivo, estava lendo ou tentando ler um jornal atrasado, do dia anterior, a manchete era sobre o caso Bruno, goleiro do flamengo. Talvez, não sei, pode até ser, que ele se envolveu emocionalmente com as notícias e soltou a seguinte frase, acredito eu, que foi sem querer:

“É assim que começa, espanca a irmã mais nova, cresce, espanca a esposa. Ninguém deve estranhar quando sua cara aparece estampada nas páginas dos jornais por ter agido com brutalidade contra alguém.

Malditos sentidos feminino com os quais elas conseguem fazer diversas coisas ao mesmo tempo, falar e ouvir as pessoas ao seu redor, eu e o pobre do rapaz comprovamos isso, pois, quando ia abrir a minha boca para apoiá-lo, a mãe das crianças afastou o celular do ouvido e virou raivosamente para o rapaz:

“O quê! Você está dizendo que o meu filho é um marginal?”

“Não é isso.....”

Tentou argumentar, ela não deixou.

“O senhor disse isso mesmo, disse que o meu filho é um futuro bandido”

“Dona, eu não disse nada disso”

Na verdade, ele disse quase isso. E que não era difícil supor para quem estava dentro do ônibus que não era normal uma criança espancar outra com tamanha violência como aquele menino fizera com a irmã, sem que a mãe tomasse nenhuma atitude. E vendo aquilo, achávamos que na casa do menino deveria ser comum tal espancamento praticado por ele na irmã. Claro que covardemente mantemos o nosso silêncio, enquanto o rapaz ao meu lado estava ouvindo horrores.

O clima dentro do coletivo tornara-se tenso devido um comentário politicamente correto que foi solto no ar, assim, meio sem querer. Sendo um comentário ouvido por uma mãe que não enxergava além do seu umbigo. Pode até ser que ela tenha outros sentidos apurados, além de prestar atenção em várias coisas ao mesmo tempo, mas o de ser mãe ficou-me a dúvida.

A mulher disse-lhes palavras tão ofensivas e com palavrões que nem Houaiss ousaria colocar em seu dicionário, e nem eu tenho coragem para colocá-las aqui, nessa página. A turma do deixa disso tentou acalmar a dona, e ao mesmo tempo ficar do lado do rapaz da infeliz frase, decerto que não obtiveram sucesso. A mãe das crianças em sua visão turva, agora achava que o menino estava correto ao espancar a irmã manhosa. Fez-nos entender isso entre gritos raivosos e apontando o dedo para o nosso malfadado comentarista.

Diante do tumulto o motorista parou o “busão” (termo muito usado pelos jovens) para tentar resolver o imbróglio, pois, a mulher queria de qualquer jeito espancar o pobre do indivíduo. E, eu ao seu lado sendo exprimido na janela preocupado em levar as sobras dos tapas caso ela se soltasse das mãos da turma do ‘deixa disso’ e partisse para cima do infortunado, claro que iria sobrar para mim. Os filhos vendo a cena choravam apavorados. Até mesmo o pequeno responsável.

O rapaz sentindo que o ódio da mulher por ele agora seria demonstrado em forma de agressão, aproveitou uma brecha no tumulto e na porta, pulou, o motorista perdido com os gritos esganiçado da mulher agradeceu aos céus quando viu o objeto da raiva da mulher pular fora do coletivo.

Como o ser mais próximo do “causador do tumulto”, fiquei aliviado ao vê-lo descer correndo. A desbocada, e mal preparada mãe foi falando em nosso ouvido até chegarmos ao centro da cidade.

Andar de busão é isso, um dia sem espaço nem no corredor, outros com espaço e pessoas exóticas. Gentes interessantes, outras nem tanto, mas tudo é vida, viver é assim, um dia tranqüilo, outros nem tanto.

Kaká de Souza

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