Quinho recebeu uma carta de sua irmã com os seguintes dizeres: urgente e outras tantas palavras, entretanto, ele pediu para seu velho vizinho ler, pois, Quinho era analfabeto. Quando pequeno, exatamente no dia que ele foi á escola, um grande fazendeiro com o codinome de coronel, o qual mandava e desmandava na região tinha mandado derrubar o colégio dizendo que não queria ninguém letrado em seu domínio. Por isso a sua necessidade de procurar alguém que a lesse. A carta dizia que a irmã estava muito doente e queria falar muito com ele. Sua preocupação foi imensa, seu único laço parentesco estava doente. Partiu do interior da Urbe Grande para o centro.
Joaquim da Cruz ( Quinho) é um sujeito simples, trabalhador rural, plantava em seu sitio hortaliças e frutas, tinha duas vaquinhas, uma cabra, um casal de suínos. Fazia manteiga e queijos, que somando com o que ele cultivava em suas terras era mais do que suficiente para ele viver bem. O que sobrava ele vendia em sua pequena vila.
Deixou o velho cuidando do sítio e viajou por horas até chegar na Urbe Grande. Na rodoviária perguntou como chegar no bairro aonde sua irmã morava. Não conhecia nada de nada de Cidade Grande, aliás, não conhecia Cidade alguma. Nasceu e foi criado na roça. Conhecia tudo das culturas de plantações, de animais, a época certa das cultivações de milhos, feijão, verduras. Só não sabia ler, ah, também conhecia os movimentos da lua.
No caminho para o ponto de ônibus precisava passar no centro da Urbe. Sentiu um tremor estranho na barriga, dor intensa, o salgado que ele comera não lhe fez bem. Colocou a mão na barriga tentando segurar.
Um guarda - municipal achou estranho um sujeito curvado apertando a barriga. Pensou: deve estar mal-intencionado. O seguiu.
Quinho desesperado andando na calçada com pessoas lhe esbarrando, 10 horas da manhã, tumulto total. Ele suava com a dor intensa na barriga. Parecia-lhe ser a mesma dor de suas vaquinhas ao parir. Não se aguentava mais, viu um canto, uma esquina, encostou na parede, desceu as calças, abaixou e deixou sair o barro.
As pessoas pararam ao ver tamanho atrevimento, carros buzinavam, pessoas gritavam. Pararam em sua frente. Umas á gargalhar. Outras com olhares recriminadores e diziam:
“- Que barbárie”
Quinho com a cabeça abaixada, sentindo-se no mato perto de sua casa, ainda não tinha notado o tumulto que sua cagada estava causando.
O guarda – municipal chegou, e ao ver o homem que ele estava seguindo na posição fecal, começou a gritar, pegou o cassetete e foi para cima do pobre Quinho, que absorto em sua limpeza intestinal não via nada e nem ouvia.
E quando a mão do guarda levantou para agredi-lo, uma outra mão salvadora segurou-lhe a arma.
-O que é isso seu animal, deixa o homem fazer a merda tranquilo. Era um negão de quase dois metros de altura que defendeu o cagão.
-Cagar na rua é crime. Gritou o guarda.
-Que crime, quando que cagar é crime?
-Atentado ao pudor, seu desinformado. Gritou raivosamente o funcionário público.
Quinho, alapardado em seu canto tranqüilo não estava e nem tinha condição de observar ao seu redor.
Devo dizer que era época de eleição, os últimos dias da propaganda eleitoral. E nessa Avenida que Quinho parou para dar uma cagadinha os políticos estavam nesse momento fazendo campanha. Devo esclarecer que tinham políticos da esquerda, da direta, esquerda quase chegando na direita. Uns eram católicos, outras protestantes, uns que pendiam para o lado que mais lhes interessavam.E acompanhando esses bando os canais de TV mais importantes da Cidadela.
Os políticos estranharam quando não eram mais o centro de atenção das lentes das TVs, foi quando ouviram:
“Tem um louco cagando na rua”
O infeliz; não. O simplório Quinho ainda em seu particular, que já não tão particular, não sabia, e como saber que a sua cagando poderia provocar uma mudança sem igual na política de sua Cidade.
Os canais de TVs chegaram e começaram a filmar. E por conseguinte os políticos estavam abismados com que seus olhares viam.
Os candidatos com chances de serem eleitos, tanto da esquerda, quanto da direita gritaram:
-Prendam esse homem, onde já se viu isso, defecar assim em público. Foram uníssonos.
-Ele tem todo o direito, está na constituição. Gritaram os radicais, que gritam sem saber o porquê, criando artigos de lei em suas mentes fantasiosas.
O Jornalista vira para o candidato que está em segundo nas intenções de votos na Urbe e pergunta:
-O senhor acha que o rapaz ali acachapado deve ser preso? Perguntou apontando o dedo para o acomodado Quinho.
-Claro que sim, isso é uma barbárie, segundo á bíblia e também em nossa constituição, a nossa cultura não permite isso. Daqui a poucos todos vão se achar no direto de também defecarem nas ruas da Urbe.
E como a Lei Eleitoral da Cidadela não permite que se entreviste somente um candidato, virou para o outro que estavam em frente nas pesquisas de intenção de votos e fez a mesma pergunta:
-O senhor acha que o rapaz ali acachapado deve ser preso?
-Claro que sim, isso é uma barbárie, segundo á bíblia e também em nossa constituição, a nossa cultura não permite isso. Daqui a poucos todos vão achar no direto de também defecarem na rua.
Parecia que os dois candidatos tiveram aulas com o Professor Papagaio (importante Aspone da política da Cidadela). Os jornalistas das emissoras se entreolharam. Não riram, mas, seria o comentário deles durante alguns dias.
Quinho em seu cantinho ainda em sua limpeza intestinal, acocorado, sem saber que a sua cagada poderia provocar um grande embate nas eleição em uma Urbe que ele mal tinha chegado e conhecido.
E com a rapidez instantânea das informações nas mídias, em poucos segundos o debate estava na boca do povo.
Cientista político tentava explicar a mudanças de atitudes e nas falas dos candidatos.
Boatos na Web surgiam como um vírus HN1, boatos difamando candidatos que antes eram a favor de uma pequena cagadinha aliciadora.
Alguns jornalistas influenciados pelo vírus perguntavam: Mas, você sempre foi a favor e dizia que todos tem direitos de decidir aonde quer cagar. Se a público ou no privado. Agora na eleição tu és contra, e desdiz o que sempre falou?
-Nada disso, e nunca disse nada em relação do fato de defecar nas ruas. E hoje mesmo eu assinei o manifesto contra essa atitude.
-Eu também. Gritou o outro candidato, o segundo na pesquisa de intenção de votos.
Os jornalistas perguntam para os candidatos:
-Os senhores não vão lá e perguntar o que o rapaz acha disso tudo?
-Para quê? Quem caga na rua, não tem direito algum.
E agora todos estavam contra a cagada do Quinho na Avenida. As igrejas, tanto protestantes como as católicas. Padres e pastores estavam junto na cruzada religiosa contra a cagada do trabalhador rural.
E as propagandas políticas tomaram um rumo mais alienantes ainda, como era normal naquela Urbe. Só se falavam sobre a cagada do Quinho. Educação, saúde, segurança? Tiraram das suas pautas políticas. Debater para solucionar? Nem em sonho. O que importa é confundir o eleitor para serem eleitos.
As falas dos candidatos eram as mesmas: no meu governo ninguém vai defecar na rua, essa é a minha principal meta. Todos concordando com a igreja: defecar somente em caso extremo, mesmo assim atrás de um matinho. Agora todos falavam a mesma língua, as quais interessavam a igreja e a sociedade conservadora da Urbe.
Quinho acabou de merdar, levantou a cabeça e estranhou, ninguém, as pessoas passavam e não o olhava. Pegou um papel no chão, limpou a bunda. Vestiu a calça e foi atrás de sua querida irmã.
Nada de se estranhar em uma Urbe onde as pessoas sofre de amnésia política e continua votando em candidatos comprovadamente desonestos.
Kaká de Souza
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