sexta-feira, 8 de outubro de 2010

O Consumidor de energia negativa.

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PRIMEIRA PARTE: “Um dia desses fui visitar o meu amigo e companheiro de causos; o Silva. Estava acamado. Sem um dos rins, fumante, tomando umas pinguinhas e comida gordurosa. Seus órgãos reclamaram, foi parar no hospital, duas semanas internado. Quando em casa fui-lhe fazer uma visita e ao ver-me disse:”

“-Pensei que dessa vez iria desencarnar. Sorriu”

-Vaso ruim não quebra, meu amigo- tive que usar essa máxima antiga, aliviar a tenção.

“Para você ver, dias atrás, antes de eu ir parar no hospital, fui ao enterro do Barreto, dois dias depois do acontecimento passei mal, juro que acreditei iria fazer-lhe companhia.

“E disse pensativamente:”

“Será que lá em cima ele continua peidorreiro?”

Não entendi esse pensamento interrogativo a si mesmo. Achei meio esdrúxulo.

“Contei-lhe sobre o meu amigo Barreto, o falecido?”

-Não, fui sucinto.

“Ele desencarnou há três semanas. Morreu tranqüilo, como deve morrer um homem da estirpe do Barreto. Partiu rodeado de amigos, parentes e seus amados filhos e a esposa. Digo para ti que foi um enterro, como posso dizer? Concorrido, amigos como eu saíra de volta Redonda até Visconde de Mauá para dizer-lhe adeus, o último, e por incrível que possa parecer, sem os seus excessos de flatulências”.

Confesso que comecei a se interessar pelo causo que iniciara Silva.

“78 Anos, era a idade dele ao partir dessa terra que muitas vezes lhe atacava violentamente seus órgãos interno e que afastavam seus familiares de perto e seus amigos.”

“Nasceu aqui mesmo, em Volta Redonda, muito trabalhador, nunca foi a escola, a não ser uma única vez. Aprendeu a ler sozinho, dizia que era autodidata. Centenas de livros em sua biblioteca sobre diversos assuntos. Que iam de filosofia até gastronomia. Não tinha um assunto que ele discutisse com leveza e sabedoria. Matemática ensinou aos filhos até eles entrarem na universidade. E tirava as dúvidas dos filhos até mesmo nas áreas que eles escolheram, engenharia e psicologia. Não tinha nada que ele não soubesse. Só que tinha um porém nisso; tinha horário e dia para conversar com Barreto”.

-Como assim Silva. Espantei-me.

“Como eu te disse, ele nasceu aqui, e aqui tornou-se pedreiro de altíssima qualidade. Com o que ganhava foi comprando terras e fazendo umas casinhas para alugar lá para os lados do Bairro 249. Trabalhador e sem vícios, tornou em pouco tempo um homem de posses, pequenas, mas seguras. Mantinha-se a simplicidade e o seu modo de vida”.

“Silva fez uma pausa e virou para mim:”

“Entretanto, ele tinha um grande defeito para a moral e os bons costumes instaurada para se viver em sociedade, dizia alguns que não o conhecia bem, e ela, a sociedade cobrava isso. Nova pausa”.

Defeito? Isso soou-me sarcasticamente ao ouvir o modo da voz que estranha saindo da boca de Silva. Ele virou para mim:

“Não vai me perguntar nada? Diz rindo para mim”

-Pode continuar meu caro.

“Barreto ao nascer, era normal, assim como nós, entretanto ao limpar a sua bunda das primeiras merdas que ele fez, sua mãe sentiu um fedor tão intenso que quase a sufocou, chegava a ser insuportável ficar perto do dejeto da criança, suas flatulências eram terrivelmente fedorentas. Foi sua mãe que me contou antes de falecer. Contava-me rindo. E como fomos praticamente criados juntos, eu convivia com os seus peidos fedidos. E como fedia!!!”

SEGUNDA PARTE: “Eu e ele fomos para o colégio juntos, entrou e sair do colégio no mesmo dia, as crueldades das crianças com ele foi terrível, até mesmo a professora, ela implicou com ele ao sentir que ele espalhou a turma, tinha soltado um pum poderoso. Não fez por mal, eu sei, estava nervoso com o primeiro dia de aula. Saiu e tomou a decisão de estudar sozinho em casa. Prendeu e apreendeu mais sozinho do que se tivesse ficado naquele colégio junto comigo.”

“Crescemos, eu fui trabalhar como motorista de taxi. Ele foi trabalhar de pedreiro. Disse-me que perdeu muito servente devido seus gases. No começo de sua vida de pedreiro era muito difícil ele arrumar serventes, entretanto, ele demonstrou ser um excelente patrão e companheiro. Coração enorme, um caráter invejável”.

“Conheceu a mulher que viveu com ele até na hora de sua morte. Mas para isso teve que enfrentar a família da mulher que era contra o seu casamento. A família de sua mulher dizia:”

“Como você pode casar com um homem porco, sem educação, que vai humilhar-te diante de suas amigas?”

“Eles conheciam a fama de peidorreiro do meu amigo Barreto. Contra todos, casaram-se. Ao casar ele já tinha uma dezena de casas alugadas, uma boa poupança, que nem a esposa sabia disso na época que casaram. Era um homem discreto”.

“A família de sua esposa foi contra o seu casamento não só pela sua fama de peidorreiro, e sim também por ele ser pedreiro, que para eles era uma coisa menor, profissão de pinguço, a mulher de Barreto ouvia isso tudo sem esboçar nada para os seus pais. Não estava nem ai para os preconceitos familiares”.

TERCEIRA PARTE: “Em um ano muito chuvoso, com tempestade que estava causando várias tragédias na cidade. A casa do sogro caiu, graças a Deus ninguém se feriu, mas a família de sua mulher ficou desabrigada, e sem dinheiro, teriam que alugar uma nova moradia. E quem estava lá para ajudá-los? Barretão. Comprou uma casa confortável para a família da sua mulher. Foi ai que dona Sônia ficou sabendo que o seu marido era um homem com várias propriedades na cidade e uma pequena fortuna na poupança. Ele achava que não havia necessidade de dizer isso para a mulher”.

“Barreto era demais, fico muito feliz em ter tido um amigo como ele”

Vi seus olhos brilharem ao citá-lo, deveria ser mesmo uma pessoa especial. Senti vontade de tê-lo conhecido.

“Você não pensa que os problemas intestinais do Barreto não afetava dona Sônia, afetava e muito. Estava ciente que casara com um homem que soltava “gases mortais”. Tomou medida para que “esse defeito” não abalassem o seu casamento.”

“Sabe o que ela fez?”

Perguntou-me e não aguardou a minha resposta.

“Quartos separados, ele em um e ela em outro bem afastado do quarto do esposo. Disse rindo, e completou: Barreto era "Joe", doutro mundo”

“Aí, tu deves está pensando; como eles tiveram filhos e eram felizes segundo eu te disse? É, ou não é?”

Tive de concordar com ele balançando a cabeça.

“Ele dizia para os amigos que os torpedos que soltava, eram energias negativas que ele soltava para o ar. Seus peidos seriam, segundo ele, as maldades que ouvia, digeria e as soltava”.

“Sua esposa então descobriu que: parece até mentira, descobriu que o mundo afetava Barreto, e como isso acontecia? A televisão, os fatos ruins noticiados fazia um enorme mal ao seu organismo. Seus órgãos internos refletiam e afetavam-se. Como isso era possível? Não descobriu. Ela tornou-se o relógio organizador do tempo do Barreto. A parte da tarde era quase impossível um ser humano normal ficar ao seu lado, pois, os gases era intensos e constantes”.

“Para visitá-lo, primeiro a família e depois os amigos que iam na parte de manhã, hora ideal para conversar com ele, e tinha de marcar, como eu já lhe disse. A procura por ele era intensa. Meu amigo tinha um jeito de falar que acalmava os corações. Não sei se você está entendendo-me?”

-Agora sim, na parte de manhã ele ficava livre dos gases. Conforme ele ia se interando das notícias ruins, seu corpo iam se acumulando de energia negativa. Difícil acreditar naquilo que eu acabara de falar, mas saiu da minha boca sem ao menos eu sentir. Esse Silva! Conta cada causo!

“Isso mesmo, era bom está perto dele, suas conversas era muito agradável. E seu coração era tão desprovido de ambição, de vaidade. Ajudava os amigos tanto em dificuldade financeira, quanto espiritual, e digo mais, sem freqüentar nenhuma igreja, dizia para todos: a igreja era seu coração. Sujeito extraordinário. Suspirou”.

“Dona Sônia, sua mulher foi a primeira a descobrir que os efeitos fedorífero eram causados pelos sistemas midiáticos, ou notícias ruim trazida aos seus ouvidos. Sua esposa espertamente colocou um exaustor no quarto de Barreto, e de manhã ela o ligava e o equipamento fazia o trabalho de jogar as energias ruim para a atmosfera, então, amavam-se. Ah Barreto!! Que saudade cara”.

QUARTA PARTE: “Quando os filhos de Barreto eram pequenos achavam a maior graça, e pediam: peida pai, e riam com os terríveis gases do progenitor. Achavam o máximo. Cresceram e o pai tornou-se uma vergonha para eles perto dos seus amigos. Vergonha dos peidos, e não dele, que isso fique bem claro. Então o controle do horário feito pela mãe, fez com que eles tivessem uma convivência muito boa com o Barreto”.

“E tem muitas histórias sobre o Barreto, lembro-me na época que o Sarney implantou o cruzado. Meus Deus! A permanência perto dele poderia causar até asfixiamento. No plano Collor, ele só não faliu devido o capital dos alugueis das lojas e apartamentos no aterrado. Mas fez com que ele ficasse dias sem se aproximar de ninguém. Seus órgãos internos revoltaram-se tento que parecia que o homem iria explodir, do mesmo jeito no impeachment.”

“Cansado de ouvir tantas notícias ruins nos jornais e outros meios de divulgação, Barreto comprou um sítio em Visconde de Mauá, lá pelo lado de Resende, mudou ele e a esposa.

"Devo concordar com ele, realmente parece que o mal está ganhando do bem." Filosofou

“Os gases agora eram constantes, nada fazia parar, ele sentia vergonha de não conseguir segurar. Esse foi o motivo de sua mudança. No sítio nada de telefone, equipamentos nenhum elétrico, somente seus livros. Fugia do mundo real. Vivia tranqüilo, e como por mágicas seus gases terminaram. Tornou-se um filósofo e amante da natureza. Sinto que o mundo perdeu, eu perdi um grande companheiro”.

Falou isso e vi seus olhos umedecidos. Ficou em silêncio.

Fiquei mais um tempo conversando com Silva. Estava cansado, ainda em recuperação. Despedi-me e sai. Já na rua e com um sorriso no rosto. O Silva conta cada causo, o danado até chora.

Kaká de Souza

3 comentários:

  1. Uhuauhauhhua Muuuuito comédia. A Barretão peidorreiro, que descanse em paz.

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  2. Haha adorei o seu blog, mas que texto divertido.
    Parabéns escritor.

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  3. Interessante e cómica essa história. ashuashuas

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